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29 dezembro 2006

Balançando 2006: mais um ano, mais guerras....


















A GUERRA JÁ ESTÁ PERDIDA

O fanatismo ideológico ajudou a destruir o Iraque, a fazer renascer os talibãs no Afeganistão, a aumentar a ameaça do terror.
Quando a guerra corre muito mal e as suas justificações mentirosas ficam expostas, insistir que um Iraque "democrático" é visível no horizonte e que "devemos manter o rumo" torna-se fantasia total. Que fazer?
Nos Estados Unidos, um grupo de anciãos do Departamento de Estado foi chamado para preparar um relatório. Neste, admitiram o que todo o mundo (excepto Downing Street [a residência oficial de Blair, nota do tradutor]) já sabia: a ocupação é um desastre e a situação é cada dia mais infernal. Em consonância com o voto dos norte-americanos nas eleições intercalares, a Casa Branca sacrificou o senhor da guerra do Pentágono, Donald Rumsfeld.
O senhor da guerra de Downing Street, porém, ainda anda a monte, como um zombie, na recusa de que algo de sério esteja mal nas ruas de Bagdad ou Cabul. Para ele, tudo pode ainda ser remediado com uma dose de xarope humanitário (uma droga tão poderosa e audaz que nenhuma resistência é possível). As suas tentativas desesperadas de passar por homem de Estado tornaram-no objecto de troça nas capitais árabes aliadas e na Zona Verde de Bagdad. O Iraque é o cordão umbilical que o une ao seu destino.
Entretanto, os veteranos em Washington reconhecem a dimensão do desastre. As suas descrições são fortes, mas as suas recomendações são fracas e patéticas: "concordamos com o objectivo da política norte-americana no Iraque, tal como enunciado pelo presidente: um Iraque auto-sustentável, que se possa governar e defender a si próprio". Noutro ponto, recomendam um acordo com Teerão e Damasco para preservar a estabilidade do pós guerra, implicando assim que Bagdad não poderá voltar a ser independente. Ficou para um militar realista, o general William Odom, a exigência da retirada completa nos próximos poucos meses, perspectiva apoiada pelos iraquianos (xiitas e sunitas) em sondagens sucessivas. A ocupação, informa-nos Kofi Annan, criou uma situação muito pior que a vivida sob Saddam.
Como tudo era diferente nos dias felizes que se seguiram à captura de Bagdad... Duas linhas de argumento surgiram no campo vitorioso. O Departamento de Estado queria um acordo rápido com os generais de Saddam para estabelecer um novo regime, de modo a que as tropas norte-americanas e subsidiárias pudessem retirar-se para bases no norte do Iraque e no Koweit para policiar o futuro. O Pentágono e o seu auxiliar de Downing Street queriam a aplicação bruta de "poder duro" e uma longa ocupação para estabelecer um novo Iraque como um modelo do "poder brando" dos Estados Unidos em toda a região.
Esta opção nunca foi séria. O apoio incondicional dos Estados Unidos a Israel impede qualquer possibilidade de "poder brando", no Iraque ou onde quer que seja. Usar a Fatah para promover a guerra civil na Palestina não parece que possa melhorar alguma coisa. Mesmo os regimes árabes mais pró-americanos na região - Arábia Saudita, Egipto, Jordânia ou os Estados do Golfo, que cumprem a agenda de Washington – permitem virulentas denúncias das políticas ocidentais nos média, como válvula de contenção dos seus cidadãos.
Nenhum dos cenários rabiscados em Washington, inclusive pelos Democratas, põe em perspectiva qualquer retirada norte-americana. Isso é uma derrota demasiado insuportável para sequer considerar, mas a guerra já foi perdida, tal como meio milhão de vidas iraquianas. Tentar atrasar a derrota (como no Vietname), enviando um reforço de tropas, é improvável que resulte.
O parlamento britânico, ainda mais vergado que o seu equivalente norte-americano, votou contra qualquer inquérito oficial sobre o envolvimento britânico na guerra, mesmo sabendo que uma maioria no país se opõe à continuação deste conflito. O fanatismo ideológico de Blair ajudou a destruir o Iraque, a fazer renascer os talibans no Afeganistão, a aumentar a ameaça do terror na Grã-Bretanha e a produzir legislação repressiva que nem durante a Segunda Guerra mundial teve lugar. O seu partido degenerado e a oposição concordaram com estas medidas repelentes. É tempo para uma mudança de regime por cá.

Tariq Ali

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